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Carroção do Tempo (dos polacos)/Reverberas
(releitura)
Quando a tarde cai e as cortinas decem, pelos deuses, ainda ouço a voz nostálgica daquele auto falante sonolento, da sociedade Guaíra anunciando a chegada e o começo do fim do mundo, a festa de domingo, a geada de segunda, a missa bizantina! A rua Alagoas levanta a poeira cascalhada, dona Emilia acaba de batizar o recem-nascido, e agora está comadre de minha mãe, mas, quando cai a tarde também cai a vida, e Odete sua filha moça, de pernas branquelas e grossas, com sua bicicleta azul chegará da fábrica da linhagem, onde é operária. Todos os dias leva marmita no bagageiro da bicicleta e à noite já pode experimentar os mistérios do amor... Paulinho, seu irmão, espreita-me quando passo, finjo que não o vejo, não quero saber dele, oculta-se sempre sob a pérgula de heras e musgos daquele macabro portão de madeira, parece uma estátua mórbida numa cripta medieval, com suas imensas orelhas de abano, ouvindo a acústica do mundo! Não entenderei nunca o destino de Odete, não entenderei nunca o destino de Paulinho. Odete se casará de véu e grinalda, Paulinho será ceifado aos vinte um anos... sua mãe se guardará na loucura, continuará morando no mesmo lugar, e eu mudarei de endereço para pegar o ônibus e ir ao colégio das freiras... O muro de Berlim continuará erguido, e mesmo depois de caído ainda assim não entenderei o destino... e na Faculdade de Direito, voce me beijará com seu sorriso nas escadarias, na praça Santos Andrade, enquanto o morno sol de inverno derreterá a geada, por entre as araucárias...
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Lilian Reinhardt
Lilian Reinhardt
Enviado por Lilian Reinhardt em 30/05/2010
Alterado em 30/05/2010
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